domingo, 26 de setembro de 2010



Órfão



Todos os pais querem,

ainda que nem percebam com clareza,

que seus filhos um dia sejam órfãos.

Refletindo um fato natural,

que aqueles mais idosos nos deixem antes

e jamais passem pela insuportável tristeza

de enterrar os mais jovens.


Mesmo assim, a dor é imensa

e o tornar-se órfão está longe de ser fácil.

Há espaços de conversas

que são próprias de pais com filhos

e quando nos faltam

parece que um vazio sem tamanho se abre,

uma ausência impossível de se cobrir.



Somente a constatação
da beleza da vida vivida é que consola um pouco,

mas que perdura breve,

logo retornando a saudade do que nem sequer houve.

Uma saudade de um futuro abortado,

mas que a lembrança do passado procura consolar,

ainda que não consiga, tenta.



Pai e mãe, só há um de cada

e cada qual cumpre de forma única seu papel.

Nós, uma vez filhos, outras pai e algumas mãe.

Pouco importa, a vida segue

e só nos resta seguir na vida.

Ainda que a morte sinalize somente a primeira etapa,

enquanto houver lembrança haverá vida.



Vida espalhada em cada um

que por meio da lembrança

faz a vida deles seguir adiante simulada por nós.

Presentes nas forças para incluir em nossas vidas

cada um de seus feitos, desejos e convicções.

Permitindo que a vida possa fluir

como eles queriam que fosse, afinal.





terça-feira, 7 de setembro de 2010















PIC-NIC EM BRASÍLIA



Sete anos de Brasília fazem tudo ter sabor de despedida, mesmo quando não se vai embora. Nada a ver com política (tudo lembra política nestes tempos de setembro 2010), muito menos desconforto ou vontade de ir embora. É que sete anos consolidam um tempo de melancolia. Tempo bom, de aprendizado e de entretenimento.

O Parque da Cidade sempre ficou no centro, visto de um lado ou do outro, sempre navegamos ao seu redor, desde os tempos do Bonaparte. Tudo lembra JK, até o nome conferido de sua esposa Sara ao Parque.

Brasília é uma promessa. De vários, JK entre eles. No caso, um comício em Jataí-Go. E quem é que lembra de promessa de comício? No entanto, menos de três meses depois de tomar posse na presidência, JK deu o primeiro passo para construir uma nova capital no centro do país.

JK cumpriu a promessa mas não foi totalmente original, nem seguer é dele a idéia da capital no centro do País. A inspiração está presente em dispositivo incluído em sucessivas Constituições desde os tempos do Império. JK chegando à Presidência em 18 de abril de 1956 (um ano exato após Einstein morrer) Juscelino enviou projeto de lei ao Congresso Nacional. Não sem enfrentar fortes oposições de parlamentares, o projeto se transformou em lei, sancionada a 19 de setembro de 1956, que fixava os limites do novo Distrito Federal e autorizava a criação da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap).

Se ousadia já não fosse pouca, outra lei, de 1º de outubro daquele ano, fixou a data para a mudança da capital: 21 de abril de 1960. Significava que tudo teria que ser feito no curto espaço de três anos e sete meses.

Ora, se a capital foi de fato erguida em três anos e sete meses, por que não comemorar e se dar por satisfeito com o dobro e não ter construído capital (nos dois sentidos) alguma (ou algum no sentido inverso)?

Um pic-nic é sempre um pic-nic. Mais patos do que formigas. Um final de tarde de sol quente abrindo espaço para um vento fresco ameaçando ficar frio, tal qual deserto que de fato é.

Como diria Leminsky: por que Brasília não pode ser apenas uma cidade? Pedras, nada mais que pedras, sem a exigência de carregar junto essa história, que tanto lhe pesa nos ombros. Brasília das lamúrias, dos escandâlos, mas que também sabe ser Brasíla dos pic-nics.